quarta-feira, 20 de agosto de 2014

"My my baby blue..."

Centésimo post hoje. Só levou 4 anos para chegar a isso, sou tão rápida haha'
Mas infelizmente não sinto vontade de escrever hoje por motivos felizes. Desde a morte de Robin Williams a internet foi dominada por textos e vídeos lembrando sobre depressão, lembrando como a doença afeta a pessoa e sobre a teoria de que comediantes e pessoas que fazem mais piadas em geral são as que geralmente sofrem mais de depressão.
Eu não sou especialista, mas isso não importa, não vim falar cientificamente sobre isso hoje. Vim falar sobre mim mesma, como normalmente faço aqui.
Aqueles que me cercam, desde que eu me lembro, me consideram uma menina feliz, alegre, animada e com um jeito quase infantil por estar sempre saltitando e brincando. O que a maioria não sabe, ou talvez saiba mas finge que não ou ignora, é que isso é apenas o que sou por fora e isso tem ficado cada vez mais claro desde que fui para a faculdade. Confesso, não me sinto absolutamente nada a vontade nesse ambiente, todos querendo ser tão adultos, aquela sensação de que somos obrigados a crescer de repente. Não há espaço para brincadeiras, no máximo para bebidas, festas e pegação, três coisas que eu não gosto tanto, principalmente quando combinadas. Parece não haver espaço para alguém com uma personalidade animada de um jeito quase que inocente e infantil. E foi assim que eu acabei me vendo quase obrigada a me livrar da máscara que sempre usei.
E sem essa máscara eu passei a me sentir cada vez pior. Eu passei a questionar quem eu realmente sou, até que ponto aquela menina saltitante era eu e a cada dia eu sentia menos vontade de sorrir ou interagir com pessoas. Conversar passou a ser algo doloroso e cansativo porque eu não fazia e ainda não faço ideia de como fingir ser feliz sem parecer uma criança e eu não queria deixar transparecer o quão infeliz eu me sentia. Claro que esse problema para conversar acabou tornando difícil fazer amizades e eu passei a me sentir sozinha mesmo na multidão.
Enquanto isso eu via pessoa à minha volta fazendo amigos e via meus antigos amigos sendo felizes, conhecendo novas pessoas e tocando suas vidas tranquilamente sem mim. Foi inevitável me comparar a eles e pensar até que ponto eu era importante para alguém, para o mundo em geral e as conclusões que eu cheguei acabaram me deixando ainda pior.
Eu comecei a passar dias inteiros vendo vídeos no YouTube e jogando videogame, completamente isolada, interagindo com seres humanos apenas durante as aulas, quando via meu namorado e nas raras vezes em que meus amigos do ensino médio marcavam algo. Eu mudei. Mudei completamente e da pior forma possível. Eu não sabia mais me comunicar, estava péssima mas não sabia como dizer e isso me afastou dos meus pais. Eu os culpei por não me compreenderem mas não percebia que eles não me compreendiam porque eu não sabia dizer o que eu sentia. Mas antes de eu corrigir isso houve um longo período em que eu sentia que vinha para casa apenas para ver meus cachorros porque eles eram o que me trazia alegria.
Minha vontade era desistir da faculdade, desistir da vida. O que me manteve aqui foi pensar que pelo menos para meus pais eu poderia fazer falta. Em vez de falar tudo, eu disse apenas que estava com dúvidas sobre a faculdade. Minha mãe me pressionou tanto, sempre me perguntando o que raios eu queria da vida quando eu já me perguntava aquilo todo santo dia sem achar uma resposta, que acabamos brigando e muito durante esse período. Eu já não sabia me expressar e ela parecia não ouvir o pouco que eu conseguia. Pensei em falar com meu pai mas eu tinha pouquíssimo tempo com ele sem que ela estivesse por perto. Não queria falar com ele em casa onde ela estaria e poderia ouvir ou entrar no cômodo a qualquer momento e eu também não queria que meu pai dissesse para ela o que eu falei, afinal minha mãe parecia não compreender e cada nova informação que ela recebia resultava em mais pressão. Mas infelizmente (pelo menos para mim naquela situação não era uma situação feliz) meu pai parecia contar tudo para a minha mãe mesmo que eu pedisse o contrário e dissesse que só pioraria as coisas para mim.
Minha relação com a família passou a ser quase inexistente, eu sentia que quase não tinha amigos, estava insatisfeita com minha vida e ainda tinha mais um monstro para se juntar à festa: a comparação.
Eu sempre me comparei muito a outras pessoas. Não costumava ser nada muito importante nem me afetar demais, até a faculdade chegar. E foi então que começaram os coeficientes de rendimento. Tenha um CR bom e portas se abrem, tenha um mediano ou ruim e nem mesmo os horários de aulas que você quer você consegue pegar, muito menos as aulas legais. Você é forçado a ser melhor que todo mundo ou pelo menos melhor que a maioria e eu que nunca tive problemas para fazer isso na minha vida passei a ter. A menina que costumava estar entre os melhores da sala sempre de repente teve parte do seu horário mudado por causa do seu CR e no final do semestre pegou exame de uma matéria. Não era para menos, com tanta coisa me incomodando, a ultima coisa que me senti motivada a fazer foi estudar. Eu estudava o mínimo necessário, exceto em algumas matérias que realmente me interessaram, como economia, matemática e estatística e mesmo nessas em que eu estudava mais eu via que tinha muita gente me passando.
Passei a me sentir um lixo. Até a inteligência que sempre disseram que eu tinha havia me abandonado totalmente. Ela não servia nem para me lembrar mais de que eu precisava estudar. E continuei me comparando.
Da comparação de notas passei a comparar vida, habilidades, estilo, beleza... Comecei a achar que minha vida era muito sem graça porque eu quase não saía, mas culpava a falta do que fazer na cidade, o que realmente é verdade, aquela cidade só tem um shopping razoável, um muito afastado, um Subway e o resto parece ser voltado para a música sertaneja, que não me agrada. Sem vontade de fazer qualquer coisa, passei a ficar muito tempo em redes sociais e no YouTube, ambos lotados de pessoas que eu considerava mais bonitas e mais habilidosas. Eu podia acordar super feliz comigo mesma e com meu corpo, mas em pouco tempo eu já estava sendo lembrada do quanto eu queria ter pernas mais longa, olhos maiores, um rosto mais fino, costas menos largas, uma cinturinha, peitos maiores (porque aparentemente peito é tudo o que importa para homens da minha idade ultimamente e quanto maior, melhor), cabelo mais longo... Eu queria mudar tudo em mim, inclusive o que é impossível e com o que vou ter que aprender a conviver pelo resto da minha vida.
Via tantas blogueiras de moda e várias meninas estilosas no campus e quando me olhava no espelho via uma menina que só sabia usar calça jeans e camiseta básica, em boa parte por vergonha do próprio corpo. Passei a questionar que imagem eu passava, qual era a minha identidade e se eu era tão sem graça quanto as minhas roupas. Tentei mudar mas continuava incomodada com o meu corpo, sem conseguir me sentir a vontade com uma saia porque não queria mostrar minhas pernas que sinceramente são as partes do meu com que eu ainda tenho menos problemas.
Descobri que desenhar me acalmava. Comecei a desenhar. Nunca fui capaz de fazer desenhos realistas então gosto de fazer desenhos estilo mangá, mas mesmo com esse tipo tinha problemas. Descobri o estilo chibi e comecei a usar e abusar dele. Ficava satisfeita com os resultados e ainda praticava quando estava com mais calma o estilo mangá tradicional sem ver muito progresso. Então chegava alguém em alguma rede social com aqueles desenhos lindos e incríveis e começava a pensar "por que vou continuar fazendo isso e me esforçando para melhorar se sempre vai ter alguém muito melhor para me massacrar? Eu posso continuar treinando mas essa pessoa também estará e com a velocidade do meu progresso eu jamais a alcançarei". E esse pensamento passou a me dominar em todos os tipos de hobbies que eu pudesse pensar em ter.
Tanta comparação e todo o complexo de inferioridade que isso me gerou, junto com todos os outros elementos fizeram ficar  extremamente mal e eu não sabia com quem compartilhar. Lembrei de um namoro em que o cara terminou comigo dizendo que eu exigia demais no estado desanimado em que eu estava e que ele gostava mesmo da Alissa que era feliz. A sensação de que todos me abandonariam se eu mostrasse como estava me fez ficar quieta guardando tudo para mim, o que só piorou tudo, e eu cheguei a um ponto em que não importava mais quantas coisas boas acontecessem, eu via apenas as ruins.
Depois de algum tempo, me abri com meu namorado. Era a única pessoa que parecia ouvir e compreender, mas mesmo com ele não foi tudo maravilhoso. Ele chegou a brigar comigo algumas vezes, principalmente quando eu passava longos períodos desiludida com a humanidade. Por vezes chego a pensar que exijo demais. É a pessoa com quem falo mais abertamente sobre isso.
E eu contei isso tudo para dizer que eu acredito ter depressão e que não é fácil. Quem sabe que você tem pode até tentar te animar, mas meu namorado sabe muito bem que isso é algo complicado de se conseguir. As coisas ruins parecem se sobressair em relação às boas e todo elogio é bom de ouvir por fazer com que você saiba que alguém pensa isso de você, mas não mudam a imagem que se tem de si próprio. Vivo em uma família onde meu pai pensa que depressão não existe, que é coisa da cabeça da pessoa, frescura pura (sim, eu já ouvi ele dizendo isso para outras pessoas), e minha mãe pensa que eu ando triste por que não faço nada, sem pensar que existe a possibilidade de que eu não sinta vontade de fazer nada exatamente por não estar bem, o que é um fato. Eu não sinto mais vontade nem de jogar videogame ultimamente e essa costumava ser minha válvula de escape. Mesmo tendo resolvido ao menos em partes as brigas com minha mãe, ainda não me sinto capaz de dizer tudo isso para minha família. A sensação é sempre de que tudo vai voltar a ser como era, com minha mãe falando mais que ouvindo e meu pai acreditando "pero no mucho".
O resultado é que hoje eu me sinto culpada porque parece que estou sobrecarregando meu namorado, afinal ele é a única pessoa com quem sinto que sou capaz de falar sobre isso e mesmo que não fale ele me dá atenção suficiente para perceber que não estou bem e acaba tentando me animar sempre, muitas vezes sem sucesso. Não por culpa dele, mas por minha culpa, por deixar tudo chegar ao ponto em que chegou, sem saber como sair. Claro, tem terapia, mas antes e durante seria necessário explicar aos meus pais o que acontece e eu continuo com medo de ter essa conversa, ser mal interpretada ou receber mais pressões, dessa vez pressão para ficar melhor logo, para "deixar de frescura".
Não é agradável viver assim. Quando chega o fim do dia eu só quero ser capaz de me sentir bem, voltar a trazer alegria para as pessoas como eu trazia quando era a menina boba e saltitante do ensino médio e achar minha própria identidade. Eu mal posso esperar pelo dia em que conseguirei.

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